sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Nossos sintomas e nós...

Há algum tempo conhecemos a relação mente/corpo, porém atualmente é inegável que determinadas doenças e/ou sintomas sejam 'produzidos' pelo nosso corpo como forma de 'proteção' ou sinal de que algo não está indo bem no percurso de nossa vida...

Percebe-se, cada vez mais que, quando o psiquismo não dá conta de determinada questão ela 'migra' para o corpo, quase como um pedido desesperado de socorro dizendo: por favor, vamos olhar para isto e buscar uma solução juntos, para minimizar nosso sofrimento?!

Se negligenciamos estes sinais, evitamos tratar, os sinais migram e emitem novas mensagens...

Temos percebido na prática clínica casos de crianças, por exemplo em que a alta exigência dos pais e a afetividade 'atrapalhada' estavam presentes no cotidiano daquela família...a criança então apresentava sintomas quase psicóticos e dermatites severas, entretanto com meses de atendimento e mudança na conduta dos pais, as dermatites somem e os sintomas desaparecem...o que ocorreu? Como o problema de pele pode ter melhorado sem a intervenção de um dermatologista?

Sem jamais desqualificar a parte clínica, aliás, sempre e em primeiro lugar, buscando-se descartar estes sintomas...verifica-se que se não houver nenhuma implicação de caráter orgânico, genético, etc...precisamos buscar o porquê de estarmos produzindo alguns sintomas...

Neste ano que está findando foram inúmeros casos que sintomas físicos chegaram a clínica, sem que nada tivessem a ver com a parte física...clientes que tiveram uma verdadeira peregrinação pelos médicos e estes, após minuciosa investigação encaminharam ao atendimento psicológico, pois verificaram que nada mais havia a fazer...

Então me pergunto se, além destes clientes saudáveis que buscaram atendimento e que estão bem porque se conheceram e entenderam a função daqueles sintomas em suas vidas, quantos mais estarão por aí, tomando remédios e negando seus sintomas, para não ter que entrar em contato com suas realidades?

A culpa, a raiva e outros sentimentos não identificadas podem dar ao sujeito uma visão equivocada dos processos que está vivenciando em sua vida...Se fiz algo que não consigo me perdoar posso produzir um sintoma em mim mesmo, a fim de que possa ser de certa forma 'castigado' por isso, sem perceber que estou realizando este processo!

Se sofri uma grande desilusão amorosa, posso deixar com que meu corpo fique gordo, sem forma, a fim de não atrair mais ninguém, evitando os relacionamentos amorosos, como forma de me proteger de uma nova decepção, da mesma forma que se entendo que fiz alguém sofrer, posso produzir um sintoma em mim mesmo, no meu rosto, a ponto de ficar repulsivo, que ninguém me olhe, assim também evito os vínculos, as aproximações e recebo a punição que mereço pelo mal que causei a mulher que deveria ter feito feliz...

São processos a nível inconsciente que se trazidos a consciência por meio da terapia fazem todo o sentido...já trabalhei com clientes que pensavam ter gravíssimo problema no coração, pela imensa carga que carregavam...a partir do momento em que conscientizaram que tudo o que traziam consigo não era seu e conseguiram delegar funções e devolver aos outros a 'carga' que lhes pertencia, os sintomas desapareceram...

Por que algumas pessoas que não conseguem 'dobrar-se' a determinadas coisas, desenvolvem patologias nas articulações dos joelhos?! Por que 'este' sintoma e não 'aquele'? por que 'nesta' época de sua vida e não em outro momento...

Cada vez mais penso e sinto dessa maneira...somos um sistema integrado que funciona de maneira ecológica com tudo o que está a nossa volta...não desvalorizemos nossas emoções, sentimentos, pensamentos...eles tem capacidade imensa de fazer com que sejamos seres mais ou menos felizes e inteiros no mundo em que vivemos...depende da maneira como olhamos e valorizamos a presença desses elementos em nossa existência!!!

sexta-feira, 11 de maio de 2012

Caminho do meio...

Qual é o caminho do meio?! Esse desejável equilíbrio entre o “não se deixar abusar” pelo outro, como forma de não perder o afeto e também não pretender ser alguém auto-suficiente a ponto de desejar viver sozinho que não precise de ninguém...

O que fazer se, quando crianças, nossos registros nos mostraram que não fomos interessantes o suficiente para ter um extenso grupo de ami
gos e ser aceito por eles, como gostaríamos? Se não “tivemos permissão para ser criança e sofremos críticas severas, quando estávamos descobrindo o mundo...” Se viajamos bastante, pela profissão dos pais e não conseguimos construir vínculos significativos? Se nossos pais não confirmaram nossa “importância” como seres em construção, nas mais singelas atitudes? E a partir daí construímos então diferentes estratégias de sobrevivência, tais como, “faço qualquer coisa pelos outros, desde que eu não perca o afeto deles” ou “ não me vinculo a ninguém, pois os vínculos só me trazem dor e sofrimento, então me congelo”, ou “ o mundo é frio e perigoso, então preciso agredir para me defender...”, “ preciso ser perfeito, pois se errar, corro o risco de deixar de ser amado”, entre outras inúmeras construções que o psiquismo irá estabelecer, para defender-se daquilo que irá lhe trazer desorganização e dor.

Durante algum período estas estratégias poderão ser bastante eficazes, até vitais porque a criança, no momento em que se descobre desprotegida e lança mão de algum recurso para “salvar-se” está sendo espontânea, adequada, entretanto, se permanecermos, na idade adulta utilizando os mesmos recursos para as mais diferentes situações, vamos entrar em sofrimento, este é um sinal importante: estamos doentes!!! É! Repetição é doença! Crescemos, temos um psiquismo que deveria reagir de acordo com sua mente adulta, no entanto, responde como criança, emitindo a mesma resposta às mais diferentes situações...podemos chamar essa atitude de embotamento da espontaneidade.

O que é embotamento da espontaneidade? É quando uma pessoa começa a ter respostas reguladas, fixas, para as mais variadas circunstâncias... quando está impedido de dar respostas criativas, originais, tornando-se simples engrenagem de um sistema, agindo de forma estereotipada, e restringindo assim sua possibilidade de participar plenamente do destino histórico de uma sociedade! Está impedido, porque não consegue fazer de forma distinta, só vê esse jeito de ser, de estar no mundo.

Exemplo? Eu não quero que minha amiga me visite neste final de semana porque organizei coisas para fazer em casa, porém, nos meus registros de infância tenho vivências de abandono afetivo e rejeição e não consigo dizer a ela que podemos combinar uma hora para o chimarrão, pois tenho muitos afazeres...e permito que ela permaneça na minha casa uma boa parte do dia, sem conseguir dizer-lhe que estou incomodada com isso. Não consegui fazer o meu trabalho, nem reagir contra algo que, internamente me aflige, pois temo perder o afeto dos outros! Quem é que está “conversando” comigo, internamente? Uma criança desamparada que reside aqui dentro...e que embota minha capacidade de agir adequadamente...

E o que é agir adequadamente? O que é espontaneidade? Para Moreno, para o Psicodrama é a capacidade de dar respostas originais, criativas as novas situações ou então as situações antigas, é ter flexibilidade, movimento! Isso devolve ao sujeito a liberdade de ter as rédeas da sua vida em suas próprias mãos! E não sentir-se refém do outro! Como fala nossa Camila Gonçalves no seu precioso livro, para ter prazer em nos sentirmos vivos é preciso que nos reconheçamos como agentes do nosso próprio destino. O mais encantador, neste conceito de espontaneidade é que o homem, sendo um ser em relação, buscará estar presente as relações afetivas e sociais, procurando modificar seus aspectos insatisfatórios. Encontrará vínculos saudáveis que lhe confirmem positivamente!

É claro que, no exemplo da amiga há outra consideração que precisamos fazer...sendo o homem este ser relacional, cujas “patologias” vinculares resultaram dessas primeiros conexões, conforme modelos que citamos, esta amiga só pôde estar lá, “acampada” o dia todo, sem perceber o desconforto da outra, porque existe um vinculação que se “encaixa” perfeitamente! Se eu me deixo abusar, vou buscar vínculos com pessoas que são abusadoras! O contrário também ocorre...se acredito que o mundo é tirano e se sou alguém que agride sempre, buscarei vínculos com pessoas que se submetem as minhas críticas severas e crêem que estou certo nas teorias que construo acerca dos fatos...na maioria das vezes tentarei procurar relações que confirmem minha identidade...isso constitui o que chamamos de papel e contra-papel, num nível patológico!

A boa notícia?! É que nascemos espontâneos e este estado, o de espontaneidade reside dentro de nós! E pode ser resgatado e vivenciado! Ple-na-men-te! Pois o homem é um ser saudável, potente, seu próprio deus, como dizia Moreno...

Desde o início o homem traz consigo a espontaneidade, a criatividade e a sensibilidade, fatores favoráveis ao seu desenvolvimento. Esses recursos que foram perturbados por ambientes ou sistemas sociais constrangedores poderão ser recuperados através da renovação de relações afetivas significativas e da ação transformadora sobre o meio.

O treino desta espontaneidade pode começar através de uma relação respeitosa com o terapeuta e estender-se aos demais vínculos, até que o sujeito sinta-se suficiente capaz de lidar com suas questões e tornar-se novamente agente do seu destino e protagonista de sua história e a partir de então começar a escrever novas páginas no livro da vida...