quinta-feira, 26 de agosto de 2010

AS PERDAS E AS DORES DA ALMA...

          Desde que nascemos nossa vida se desenvolve em interação com outros seres humanos. É na relação com a mãe ou pessoa que desempenha este papel, que nos construímos como pessoas e é com base nas vivências decorrentes deste vínculo que apreendemos como é o mundo “lá fora”. Nas relações que se seguem a partir daí, continuamos nosso desenvolvimento num processo de co-construção de novos papéis e é inevitável que sejamos atingidos em diferentes intensidades, por aquilo que experienciamos. Deixar-se tocar, mobilizar-se pelos acontecimentos a nossa volta, questionar a modalidade das relações que desenvolvemos e buscar transformações nos aspectos insatisfatórios, é condição, para que saibamos onde estamos “pisando” no enigmático e surpreendente caminho da vida.
         É preciso que estejamos conscientes do nosso papel no mundo e que sejamos responsáveis pelo que fazemos, bem como pelo rumo que nossa existência toma, em diferentes momentos desta caminhada. Entretanto, ocorrem eventos sobre os quais não temos controle e, portanto, somos “convidados” a uma readaptação forçada, tanto no abandono, quanto na adoção e construção de novos papéis. Sofrer um trauma, como a perda por morte, de alguém a quem amamos muito, nos impõe cruel sofrimento, dilacerante e desorganizador e é, conforme relatam pessoas que vivenciaram tal situação, “uma dor daquelas que comprimem a alma”... Neste caso, passar por um período de retração, murmúrios, pesar e intensa angústia e ansiedade, é esperado. Este momento pode vir acompanhado de insônia, inapetência, raiva, inquietação, sensação de desamparo, entre outros sintomas.
        Nesta vivência tão particular e dolorosa, se faz necessário uma revisão de “esquemas”, num movimento de renúncia de determinados papéis e aprendizagem de outros. No entanto, é um processo que, além de difícil, pode ser lento, ocorrendo no ritmo peculiar de quem o vive. Diante desta experiência, ao qual o indivíduo é exposto, existem fatores que são fundamentais, para uma melhor readaptação e construção de novas maneiras de estar no mundo. A basal, diria, é a estrutura psíquica da pessoa implicada neste processo, o quanto possui recursos internos, a fim de disponibilizá-los, em situações de stress intenso. A presença da família, o círculo social de apoio a que pertence o sujeito e a fé constituem, entre outras recursos, fontes valiosas para a reorganização de sua vida no novo papel que lhe foi arbitrariamente conferido.
        Importantíssimo salientar que apoiar não significa tentar retirar ansiosamente, a pessoa traumatizada do estado em que se encontra, porém oferecer-lhe uma acolhida e, principalmente, uma escuta respeitosa, acerca daquilo que lhe convier compartilhar. Se estivermos ali para, verdadeiramente, amparar ao outro, não seria então lhe impondo nossas crenças do que “é melhor”, que obteremos êxito nesta jornada. Os calmantes, os programas realizados, os inúmeros chás ou copos de água que lhe são oferecidos, são nada menos do que “estratégias” inconscientes, de lidarmos com a nossa angústia ao “assistirmos” implacável sofrimento. Se tivermos consciência desta dificuldade que temos em lidar com a dor de quem estimamos e humildade em abandonar nossas crenças, validar e considerar o sofrimento alheio, isso basta.
       Ajudar (auxiliar, favorecer) significa sairmos do nosso lugar e nos colocarmos, sincera e inteiramente no lugar do outro e a partir de então oferecer o que pode ser mais expressivo neste momento: um espaço interno, onde possamos acolher e respeitar a dor alheia. Apoiar e amparar, a fim de que o outro se reconstrua, conforme seus particulares parâmetros, no ritmo e tempo necessários, para a superação da sua pessoal e intransferível dor... Isso é cuidar e amar: caminhar juntos, no resgate das “peças extraviadas”, de quem entende que, por hora, perdeu parte de si...

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